Narcos – 3ª Temporada
(Este texto contém spoilers para a primeira e segunda temporada de Narcos bem como a história da América Latina nas últimas décadas do século XX)
O que preferiam?
Tinham um negócio ilegal multimilionário, mas durante seis meses a justiça deixa-vos em paz para poderem facturar o que quisessem. No final desse período teriam de cumprir uma pena simbólica, mas podiam ficar com todo o dinheiro facturado até então, tornando-se completamente legal e passível de ser usado como bem entendessem, sem lavagens, sem chatices.
Ou então… poderiam continuar a facturar para sempre, mas com a justiça à perna.
É esta a premissa da terceira temporada de Narcos, mas é também mais do que isso
Narcos é uma janela voyeur para as vidas desmesuradas do cartéis de Medellin e Cali, sendo que as duas primeiras temporadas estão centradas em Pablo Escobar, cabeça do cartel de Medellin, que após a sua morte deixa o caminho livre para o cartel de Cali criar o maior império de tráfico de drogas, chegando a controlar 90% de mercado de cocaína mundial.
Narcos é também um jogo de extremos implícitos nos bastidores do cérebro do espectador.
Há uma fantasia/fetiche no desfrutar em segunda mão a vida e morte de Pablo Escobar e a relação passivo-agressiva do “não quero olhar para estes monstros, mas não consigo parar de o fazer”. Queremos ver até onde é possível espalhar o caos e pânico, desde que não seja no nosso bairro.
Consegue a terceira temporada voltar a prender, agora que não possui uma personagem com a força gravítica de Escobar? Consegue, mas por outros meios
O jogo mantém o mesmo tabuleiro mas mudam os jogadores e as estratégias. Ao contrário do cartel de Medellin, que dava uso à intimidação e violência, o cartel de Cali organiza-se como uma grande empresa, movendo a sua influencia nos elevados estratos corporativos. Gilberto Rodriguez – o homem no topo do cartel – era alguém que importava conhecer se a pretensão era estar incluído nos negócios essenciais.
Daí a intenção de Gilberto Rodriguez legitimar o seu negócio, decisão que não agrada a todos, muitos menos ao Agente Peña, cuja promoção pós Escobar o retira do trabalho de campo e o coloca nos corredores do poder onde as balas vêm de fato e gravata, em vez de camisas com motivos tropicais, ornamentadas com fios de ouro.
E por falar em roupa… Tal como nas temporadas anteriores, a atenção ao guarda roupa é exemplar, a série, por vezes, parece querer-nos tocar no ombro para discretamente nos chamar atenção para isso, ao misturar as suas imagens com as de arquivo.
Antes que o Galo de Barcelos venha dar umas bicadas, é importante referir a interpretação de Pêpê Rapazote como Chepe Santacruz Londoño, que tem provavelmente a melhor cena de todos os tempos com uma contagem decrescente, vão logo perceber quão teso o gajo é.
Na terceira temporada, Narcos é suficientemente parecido e simultaneamente diferente das temporadas anteriores para nos fechar um fim de semana inteiro em casa, colados ao Netflix e papar tudo de uma só vez para a seguir nos deixar a agonizar durante mais um ano.
Por falar nisso, a quarta temporada já está confirmada.
Autor: Edgar Sousa